sábado, 29 de agosto de 2015

Verbos em -ear e em -iar

O presente do indicativo e, consequentemente, seus derivados - o presente do subjuntivo e o imperativo - podem apresentar a falta de formas em algumas pessoas (verbos defectivos como adequar, polir, explodir, ...)(1)   Todos os verbos terminados em -ear (irregulares), ao invés de perderem formas, ganham um "i" nessas pessoas e modos;  os irregulares terminados em -iar (apenas os que estão aqui listados), por sua vez,  adotam essa inclusão.  É o assunto de hoje. 

Vamos tratar  dos verbos terminados em -ear: passear, folhear, pentear, homenagear, barbear, frear, refrear, cear... Os verbos terminados em -ear, nesses tempos e modos, ganham um "i" na 1.ª (eu), 2.ª (tu) e 3.ª (ele, ela) pessoas do singular e na 3.ª do plural (eles, elas):

          Indicativo presente                      Subjuntivo presente
          eu                      passeio              (é provável que) eu                      passeie
          tu                       passeias                                       tu                       passeies
          ele/ela/você       passeia                                         ele/ela/você      passeie
          nós                    passeamos                                    nós                   passeemos 
          vós                    passeais                                        vós                    passeeis
          eles/elas/vocês passeiam                                       eles/elas/vocês passeiem 
     
                     Imperativo afirmativo                         Imperativo negativo
                     passeia       tu                                    não passeies     tu
                     passeie       ele/ela/você                    não passeie       ele/ela/você
                     passeemos nós                                  não passeemos nós
                     passeai     vós                                    não passeeis     vós
                     passeiem    eles/elas/vocês               não passeiem    eles/elas/vocês

Os verbos terminados em -iar, por sua vez, são regulares: copiar, variar, historiar, adiar, vadiar, maquiar... Por isso sua conjugação no presente, segue este modelo: 

              Indicativo presente : eu copio, tu copias, ele/ela/você copia;
                                               nós copiamos, vós copiais, eles/elas/vocês copiam. 

Os tempos e modos derivados (Subjuntivo presente, Imperativo afirmativo e negativo) seguirão esse paradigma. Não apresentam novidade. 

O cuidado deve estar em alguns verbos  terminados em -iar considerados irregulares que se conjugam como o paradigma do "passear" naquelas pessoas destacadas em vermelho (acima). O radical com "i"  (de -iar) substitui o "e"  (de -ear), claro.  São eles: mediar (intermediar, remediar), ansiar, incendiar, odiar.  Para você memorizar com tranquilidade, a organização deles pelas iniciais forma um nome próprio masculino: MÁRIO. Veja:  Mediar (e intermediar), Ansiar, Remediar, Incendiar, Odiar

Vamos construir um modelo, com um deles; os demais seguirão esta conjugação. 

 Indicativo presente                      Subjuntivo presente
          eu                      anseio              (é provável que) eu                    anseie
          tu                       anseias                                       tu                     anseies
          ele/ela/você       anseia                                         ele/ela/você     anseie
          nós                    ansiamos                                    nós                   ansiemos 
          vós                    ansiais                                        vós                    ansieis
          eles/elas/vocês anseiam                                       eles/elas/vocês anseiem  
     
                     Imperativo afirmativo                         Imperativo negativo
                     anseia      tu                                    não anseies     tu
                     anseie      ele/ela/você                    não anseie       ele/ela/você
                     ansiemos nós                                  não ansiemos nós
                     ansiai     vós                                    não ansieis     vós
                     anseiem   eles/elas/vocês               não anseiem    eles/elas/vocês

Como esse é o paradigma, teremos: eu remedeio, intermedeio, incendeio, odeio.  

Quem não ouviu âncoras de emissoras de TV e rádio dizerem: "O ministro intermedia as negociações." ?  Ou especialistas em maquilagem insistirem em "Eu maqueio as celebridades?"   E aquelas pessoas que afirmam: "Ela se pentcha muito bem." Socorro!!! Por favor: você pode e deve, no desempenho de sua vida profissional, usar a linguagem padrão da norma culta: 

           O ministro intermedeia as negociações. 
           O especialista  maquia as celebridades. 
           Ela se penteia muito bem.

Penteie-se (para os rapazes: Barbeie-se), passeie, ceie com os amigos neste domingo e, na próxima semana, intermedeie, remedeie, medeie situações e não odeie ninguém, nem incendeie os papéis que estão à espera de suas considerações. 

Boa semana! 

           

           


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1  Veja e confira esses verbos em RYAN, Maria Aparecida.  Conjugação dos verbos em Português. 17.ed., São Paulo: Ática Editora, 2000.
Acesse também: http://www.conjuga-me.net/verbo-passear e http://www.conjuga-me.net/verbo-intermediar. 

sábado, 22 de agosto de 2015

Ortografia (II) - j ou g?

Em fevereiro de 2015, tratamos  da ortografia e um pouquinho da história que a acompanha. Como disse na ocasião,  o AOLP (1927-1931) buscou tratar do  substrato linguístico dos vocábulos da Língua Portuguesa no Brasil: palavras de origem árabe (1), africana (2) e indígena (3)

Para esses vocábulos, convencionou-se empregar j (e não g), x (em vez de ch) e ç (em lugar de ss). 

Assim, teremos: 


com J


  • jaca, jacu, javali, laranja, laranjeira, Najir,... - de origem árabe;
  • acarajé, canjica, canjerê, ... - de origem africana;
  • pajé, jiboia, jerimum, jenipapo, jiló, jirau, Moji,  ... - de origem indígena.  


com X

  • xeque (xeque-mate), xadrez, xerife, xaveco, xarope, xadrez,... - de  origem árabe;
  • caxumba, Caxambu, axé, Xangô, orixá, Oxalá, ... - de origem africana;
  • xavante, Poxoréu, abacaxi, xaxim, Xingu, ...- de origem indígena. 


com Ç

  • moçárabe, açúcar, almoço, açougue, açude, ... - de origem árabe; 
  • cachaça, miçanga, caçamba, ... - de origem africana;
  • açocê, açaí, açu, Paraguaçu, Iguaçu, Turiaçu,... - de origem indígena. 
Para um passeio pela História da Língua Portuguesa no mundo, veja o apaixonante livro do professor Paul Teyssier (4), das preciosas informações sobre história da Língua Portuguesa no Brasil (HLP) da professora Rosa Virgínia Mattos e Silva (5). No mesmo sítio do Instituto Camões,  você poderá acessar várias subpáginas confiáveis a respeito da L.Portuguesa.

Voltaremos a esse assunto mais adiante, quando abordaremos o AOLP de 1943 - a meu ver, o mais bem  (até agora) estudado e preparado. 

Por enquanto, observe a natureza a (ou à) sua volta e busque encontrar vocábulos dessas três origens,  que nomeiem coisas, seres, acontecimentos... É uma viagem bem interessante ao mundo das palavras 

Bom divertimento e boas descobertas! 


  

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(1) https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_palavras_portuguesas_de_origem_%C3%A1rabe 
(2) http://arquivo.geledes.org.br/areas-de-atuacao/educacao/planos-de-aula/planos-mais-lidos/8221-plano-de-aula-palavras-de-origem-africana-usadas-em-nosso-vocabulario
(3) http://helenaconectada.blogspot.com.br/2011/04/palavras-de-origem-indigena-presentes.html
(4) http://disciplinas.stoa.usp.br/pluginfile.php/158086/mod_resource/content/1/TEYSSIER_%20HistoriaDaLinguaPortuguesa.pdf
(5) http://cvc.instituto-camoes.pt/hlp/hlpbrasil/index.html   

domingo, 16 de agosto de 2015

Quem gosta de gerúndios?

Você sabe o que é um gerúndio? E para que ele serve?

Vamos à gramática: é a forma verbo-nominal de ação delongadora. Traduzo: ele tanto serve como verbo (é verbo na origem, portanto ação) quanto nome (forma sintática adverbial) com aspecto delongador (ação em desenvolvimento). Exs.: 
          Estamos conversando há duas horas. (ação em desenvolvimento no momento da                       fala)
           Eles estão viajando  e só voltarão na próxima semana.  (ação em desenvolvimento)
          João estava visitando a fábrica, quando você telefonou. (idem)
          Chegando ao escritório, ligue para mim. (= quando você chegar...> valor adverbial)


Quando seu emprego é impróprio, então?

Na prática, quando não for empregado nas situações acima, principalmente por má tradução dos textos em inglês com o gerúndio -ing das falas de telemarketing : I'll be sending you tomorrow (Mandarei a você amanhã), We'll be calling (ou we'll call) him later (Nós o chamaremos/telefonaremos para ele mais tarde).


Por que isso ocorre?

Pelo uso abusivo dessas formas ouvidas e lidas a todo momento, o contágio é inevitável. A outra possibilidade de interpretação é a que consiste numa intenção de quem fala (ou escreve). Cabe a nós, sabendo da impropriedade, vigiar-nos e, principalmente, procurarmos outras formas que sejam da Língua Portuguesa: empregue o futuro ou o imperfeito, tempos mais adequados às relações nessas construções. Exs.:
          Nós estávamos visitando a fábrica, quando o diretor chegou. 
    Melhor:  Visitávamos a fábrica quando o diretor chegou. (imperfeito indica ação em                            desenvolvimento quando uma outra ocorre)
          Eles prometeram que estarão enviando o material amanhã. (eles não vão ficar                       enviando, enviando, enviando...)
    Melhor: Eles prometeram que enviarão o material amanhã.


Cuidado:  quanto mais verbos você juntar em formas duplas (vão enviar, estarão enviando) ou triplas (vão estar enviando) ou a horrível quádrupla (vão poder estar enviando) mais se afastará da objetividade textual  e da confiabilidade do significado que deseja passar ao interlocutor.  A propósito veja o hilário (e exagerado, claro!) texto  "A invasão dos gerúndios assassinos" (1) de David Cohen, para sensibilizar aqueles que podem estar falando uma língua estranha (e descuidada) a todo momento.  E aproveite para ler um pouco mais a respeito de outros descuidos tanto da língua oral, quanto da escrita (2), como um reavivamento das formas desprestigiadas na língua escrita, principalmente nas linguagens empresarial, técnica, acadêmica e científica. 

Veja que você pode usar gerúndios, desde que bem empregados, claro. É uma forma legítima da Língua Portuguesa, embora nossos descobridores prefiram infinitivos: estou a acabar por aqui, pessoal. 

Boa semana!

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(1) https://portalesafaz.sefaz.pe.gov.br/moodle/cursos/Curso_Redacao_Oficial/red_mod1/gerundios_assassinos.pdf
(2)  https://portalesafaz.sefaz.pe.gov.br/moodle/cursos/Curso_Redacao_Oficial/red_mod1/revista_veja.pdf



domingo, 9 de agosto de 2015

Impropriedades (II)

Em continuidade às impropriedades que invadem nosso discurso vez por outra, hoje trataremos destes três: a partir de x com base em x desde; ao invés de x em vez de; entre x de (construções por paralelismo). 


A partir de x com base em x desde

A partir de (1) - marca ponto de partida geográfico e temporal.  Exs.: 
               A partir de São Paulo, são 98 km até Campinas.
               Contei doze passos a partir da porta de entrada até o hall social do prédio. 
    
          Se o  ponto de partida for temporal, a expressão será empregada para indicar                   ponto de partida do presente para o futuro e do futuro para o futuro. Exs.: 
               A partir de hoje trabalharemos com novas condições de pagamentos.
               Atenderemos em novos horários a partir do próximo mês.

          Se esse ponto de partida for passado em relação ao presente, usa-se desde: 
                Desde a semana passada ele está trabalhando nessa proposta. 
                Fazia tempo que não construía planilhas: desde o ano passado. 

Com base em (2)  - se você usou dados ou informações/obras de autores relevantes para seu trabalho, prefira a expressão com base em  (ou baseado/baseada em): 
               Fiz o relatório de vendas com base nos dados que me enviou.
               Baseada nas lições de Bakhtin, analisei o discurso da proposta.
               Pedro Luís soube defender suas ideias com base no que conversamos.   


Ao invés de x em vez de

Ao invés de - essa expressão opera na frase para ligar ações inversas, de oposição, pois invés  é derivado de inverso. 
               Ao invés de Carlos subir para conversar com o cliente, desceu para 
              buscar os papéis de que precisava para a reunião. (subir é o inverso de descer)

Em vez de -  marca relação de substituição (= trocar a vez): 
               A reunião, em vez de ser no 3.º andar, acontecerá na sala 5 do 4.º. 
               Em vez de almoçarem com o cliente, marcaram uma visita à fábrica.  

Entre x de 

Entre - essa preposição, em paralelismo de construção, exige a conjunção e, pois são dois pontos (daí o paralelo) que se consideram: 
               Entre a porta e a janela ficam as estantes.
               Não consegue decidir entre férias totais  e  parciais.

De -   essa preposição, no mesmo tipo de construção paralelística, exige a preposição a, pois o "de" marca o ponto de partida e o "a", o de chegada: 
               Trabalhamos de segunda a sexta, das 8 às 16h30. 
               Pediram-me, para exame de auditoria, os balancetes de abril a junho de 2015.

Como vê, de certo a impróprio, é só um descuido. 

Boa semana. 

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(1) A grafia dessa expressão é feita com três palavras separadas: a  partir  de.  Não há crase antes do verbo          (partir).
(2)  Não empregue  essa expressão como sinônima de "a partir de". Ex. do erro: Redigi o relatório a partir dos dados de vendas que me mandou. O correto é: Redigi o relatório com base nos dados de vendas...