sexta-feira, 31 de julho de 2020

-ENTE e -MENTE: quem pode ser pluralizado?

                           
SUBSTANTIVOS, ADJETIVOS, ADVÉRBIOS (I)



Substantivos e adjetivos
 pertencem à classe das palavras variáveis, dos nomes, isto é, podem apresentar flexão de masculino, feminino, singular e plural, por isso conhecida como flexão nominal. Nada nos impede, entretanto, de  encontrarmos palavras que não apresentem a flexão de gênero (masculino, feminino) ou de número (singular, plural), devido à sua origem, ou a seu significado. O artigo, o pronome, o numeral, o adjetivo, o verbo indicam-nos a flexão. 

É o caso de pires, ônibus, féria/férias, por exemplo.  Entendemos plural, quando encontramos:  
              Compramos  pires novos, para substituírem os que estavam trincados.
Muitos ônibus, por causa do isolamento social, estão limitados a poucos horários.      

Ou singular em:                                  
                                                                                      Compramos um pires novo para substituir aquele que quebrou.  
       O ônibus  das 7h30 está atrasado 

Esse tipo de concordância estudamos no capítulo Concordância Nominal, em nossas gramáticas. 

Deverbais (derivados de formas verbais), antigamente registrados como Particípio Presente (do Latim) na Língua Portuguesa, hoje são apenas substantivos e adjetivos que, terminados em -ente, recebem a flexão de plural e, na língua urbana padrão culto, não devem apresentar flexão de feminino/masculino.  São uniformes e, por isso, servem para os dois gêneros. Ex.: 
        Um rapaz inteligente.  Uma aluna brilhante. Assuntos interessantes. Há muitos ouvintes.  Sol poente. Estrela cadente. As pedintes. Uma estudante, dois estudantes. Essa gerente, aqueles escreventes.  A gente, o ente, os dentes.

A língua oral, produzida sem roteiros, emprega mecanismos analógicos que levam à construção de excepcionalidades. É o caso de "presidenta" que muita discussão trouxe por ocasião da presidente brasileira.  Por ter sido criada pelo povo na época dos movimentos feministas da década de 1960, ganhou - pelo uso constante - o registro nos dicionários. Continuamente empregado por um grande número de falantes, durante muito tempo, o vocábulo passou a ser inscrito no VOLP da Academia Brasileira de Letras. 

Num texto, esses deverbais terminados em -ente podem substituir orações desenvolvidas por "que + verbo conjugado".  Ex.: 
               As pessoas que depõem chegarão daqui a pouco.
               As pessoas deponentes chegarão daqui a pouco. 

Mais simples e concisa será a construção equivalente:
                As (Os) deponentes chegarão daqui a pouco.

Os advérbios em -mente veremos na próxima vez.  
Até lá! 
  

domingo, 1 de maio de 2016

CONCORDÂNCIA - Locuções verbais, com o pronome apassivador "se"

Duas concordâncias possíveis 


Nas locuções verbais com os auxiliares "poder" e "dever" , duas concordâncias são possíveis.  Veja isto: 

         Deve-se atender as pessoas com cordialidade. 
         Devem-se atender as pessoas com cordialidade. 

               Pode-se construir as frases com objetividade.
               Podem-se construir as frases com objetividade. 

Vamos explicar por que as duas são possíveis. A primeira construção, com o verbo no singular, leva-nos a entender que o sujeito do verbo (deve, pode) é a oração que traz o verbo no infinitivo (atender as pessoas.../ construir as frases). Na época da oitava série, hoje nono ano do Ensino Fundamental, aprendíamos a nomear essas orações: subordinadas  substantivas subjetivas. Lembra-se?  Pois bem: por serem sujeitos,  levam o verbo da oração principal (Deve-se/ Pode-se) para a terceira pessoa do singular. Como acontece nestas  construções mais simples: 
          
          Estudar/ é importante para mim. 
          É cansativo/ ler ao computador durante muito tempo.

A segunda construção, com o verbo no plural (devem, podem), leva-nos a entender como sujeito  as pessoas, as frases. O verbo está na voz passiva, e o "se" é pronome apassivador.  Como ocorre em Vende-se casa. /Vendem-se casas = casas são vendidas,  entendemos a segunda construção como: 

               As pessoas devem ser atendidas com cordialidade. 
               As frases podem ser construídas com objetividade. 

Como pode ver, as duas são possíveis e aceitáveis.  O que acontece, entretanto, são discussões sobre essas possibilidades e parece que  a opção por uma ou outra depende apenas do que nos parece "soar mais bonito". 

Em caso de dúvida, simplifique. Conjugue os verbos.  Nos exemplos acima, a saída seria: 

          Devemos atender as pessoas com cordialidade.  (ou)
          As pessoas devem ser atendidas com cordialidade. 

                 Podemos construir as frases com objetividade.  (ou) 
                 As frases podem ser construídas com objetividade. 

Divirta-se, experimentando essas construções em seu dia a dia. 

Boa semana!     


domingo, 22 de novembro de 2015

Sobre erros e desvios

E viva a "Pátria educadora"!


Atendendo a solicitações, aqui está o texto citado na página de 21.11.2015, que alguns consulentes e leitores não conseguiram acessar.  Máquinas!... 

Os livro mais interessante estão emprestado


PUBLICADO EM 13 DE MAIO DE 2011
A frase reproduzida no título do post parece ter sido pinçada de alguma discurseira de Lula. Não foi. Mas os autores do livro didático “Por uma vida melhor”, chancelado pelo MEC, decerto se inspiraram na oratória indigente do Exterminador do Plural para a escolha de exemplos que ensinem aos alunos do curso fundamental que  o no fim de qualquer palavra é tão dispensável quanto um apêndice supurado. O certo é falar errado, sustenta o papelório inverossímil.
A lição que convida ao extermínio da sinuosa consoante é um dos muitos momentos cafajestes dessa abjeta louvação da “norma popular da língua portuguesa”. Não é preciso obedecer à norma culta em concordâncias, aprendem os estudantes. Isso porque “o fato de haver a palavra os (plural) já indica que se trata de mais de um livro“. Assim, continuam os exemplos, merece nota 10 quem disser ou escrever “nós pega o peixe”. E só elitistas incorrigíveis conseguem espantar-se com a medonha variação: “Os menino pega os peixe”.
“Muita gente diz o que se deve e o que não se deve falar e escrever tomando as regras estabelecidas para norma culta como padrão de correção de todas as formas linguísticas”, lamenta um trecho da obra. Por isso, o estudante que fala errado com bastante fluência “corre o risco de ser vítima de preconceito linguístico”. No Brasil Maravilha que Lula inventou e Dilma Rousseff vai aperfeiçoando, professores que efetivamente educam não passam de “preconceituosos linguísticos”. Haja idiotia.
“Não queremos ensinar errado, mas deixar claro que cada linguagem é adequada para uma situação”, alega Heloísa Ramos, uma das autoras da afronta à inteligência e à sensatez. Em nota oficial, o MEC assumiu sem ficar ruborizado a condição de cúmplice. “O papel da escola”, argumentam os acólitos de Fernando Haddad, ” não é só o de ensinar a forma culta da língua, mas também o de combater o preconceito contra os alunos que falam linguagem popular”.
A professora Heloísa sentiu-se insultada com a perplexidade provocada pelo assassinato a sangue frio da gramática, da ortografia e da lucidez.  “Não há irresponsabilidade de nossa parte”, ofendeu-se. Há muito mais que isso. Há um crime hediondo contra a educação que merece tal nome, consumado com requintes de cinismo e arrogância. O Brasil vem afundando desde janeiro de 2003 num oceano de estupidez. Mas é a primeira vez que o governo se atreve a usar uma obra supostamente didática para difundi-la.
Poucas manifestações de elitismo são tão perversas quanto conceder aos brasileiros desvalidos o direito de nada aprender até a morte, advertiu o post reproduzido na seção Vale Reprise. As lições de idiotia endossadas pelo MEC prorrogaram o prazo de validade do título: a celebração da ignorância é um insulto aos pobres que estudam.
A Era da Mediocridade já foi longe demais.

sábado, 21 de novembro de 2015

Erros são apenas desvios? Devemos assumi-los como possibilidades de fala e de escrita? (I)

Após duas semanas  (e mais algumas que virão...)  de correções  de provas de concursos públicos da mais variada ordem de cargos, profissões e cursos,  lembrei-me de um artigo de Augusto Nunes em que o autor aponta o descaso com que se trata a concordância verbal e a nominal nas escolas, ratificada pelo livro didático aprovado pelo MEC  naquele ano (2011) com a anuência de alguns profissionais da área   (http://veja.abril.com.br/blog/augusto-nunes/direto-ao-ponto/os-livro-mais-interessante-estao-emprestado/). 

Certamente esse livro não fez aumentar o número de casos de falta de concordância verbal e nominal que encontrei nessas provas, mas, de 2011 para cá, só vejo crescer a liberalidade  - e um certo descaso - com que alguns professores tratam da questão, na enganosa litania de "Deve-se privilegiar a linguagem do aluno.". 

Disse enganosa litania?  Acrescento: pérfida, cruel.  Justifico:  a linguagem ainda é um altíssimo meio de discriminação pessoal e profissional.  E os erros de concordância são os mais visados em entrevistas e dinâmicas para a contratação de funcionários.  Quem, por exemplo, aprovaria um candidato que dissesse:  "Meus amigo 'stá empregado e eu ainda 'tô procurando..."

Afirmam alguns linguistas, num discurso mais político que pedagógico,  que desejamos impor ao povo a linguagem "de uma elite dominante".   Não se trata disso. Discrimina-se muito mais, quando não se busca elevar a linguagem do outro para o nível a que ele tem direito.  Em outras palavras, condena-se a pessoa a não sair do limbo linguístico.  

Quando se ensina ao aluno a flexibilidade das formas da linguagem, seus níveis sociolinguísticos, suas possibilidades e suas correções, atenuam-se os desníveis e aproximam-se as oportunidades.   Eleva-se, com isso, a dignidade humana.  

Veja-se, por exemplo,  a riqueza linguística de alguém que consegue falar errado por brincadeira num grupo de amigos, consegue entender-se com seus pares numa linguagem de tribo, consegue exibir uma linguagem padrão culta quando busca um emprego e, posteriormente, como profissional...   No dizer das mensagens comerciais: Isso não tem preço!

As gramáticas que apontamos em algumas páginas deste blog devem ser consultadas por todos, num esforço  de autodesenvolvimento.  Em especial, a Gramática Escolar da Língua Portuguesa, do Prof. Evanildo Bechara, oferece explicações completas e claras, com direito a exercícios que trazem respostas (na segunda edição, num livreto anexo à gramática).  

Reveja o conteúdo da concordância - tanto nominal quanto verbal - por partes, para absorver pouco a pouco seu conteúdo e colocá-lo em prática imediatamente.  Em seguida, não economize esforços em auxiliar a quem não tem acesso a essas informações, numa espécie de "corrente do bem". 

Tenho certeza de que seu trabalho será reconhecido e você se sentirá agraciado com as inúmeras possibilidades que permitirá ao outro. Em caso de dúvidas, não hesite em contatar-me. 

Bom trabalho.      


quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Zica vírus e a microcefalia dos bebês

Notícias também devem servir como momentos de reflexão linguística.  Nesta semana, a microcefalia dos bebês, principalmente os de Pernambuco, esteve na boca de nossos repórteres, entrevistados, entrevistadores... 

Cabem aqui duas reflexões: 

a.  microcefalia - vocábulo de origem grega, como a maioria dos que estão ligados à tecnologia e ciências, significa pequeno (micro) cérebro (kéfale). Ajustando, numa quase   tradução livre,  é deficiência ligada à formação fetal, de origem neurológica, que reduz a     capacidade cerebral. Consequência disso são as dificuldades de aprendizagem, para     ficarmos em apenas uma delas.   Vários repórteres e comentaristas, nas mais variadas emissoras de rádio e TV, reproduziram  estas palavras:  

           A microcefalia dos fetos dos bebês acontece por conta do vírus Aedes Aegypti...

Em primeiro lugar,  esse hediondo por conta de,  de que já tratamos em uma outra página neste blog, quando o correto seria: em decorrência de, por causa de, devido a, ...

Em segundo lugar, dos fetos dos bebês... Pergunto a você:  bebês têm fetos? A microcefalia  dos bebês acontece... ou A microcefalia dos fetos ocorre...

Em terceiro e último lugar nesse trecho: Aedes Aegypti não é vírus. É mosquito. 

Certamente você está pensando: na pressa de se comunicar, ...  Falta treinar, pessoal, falta treinar pensar direito. 

b. malformação, má-formação  - há diferença no emprego dessas palavras. A malformação permite cirurgias para correção da deformidade;  a má-formação é uma deformidade congênita,  às vezes uma monstruosidade,  com raras possibilidades de recuperação.  No caso da notícia, o mosquito causa má-formação (será isso mesmo?). 

Como você pode ver, comunicar obriga o comunicador, o emissor, a ter vocabulário.

Cuide-se! 




quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Avisos com erros de concordância e ortografia.

Em nosso dia a a dia,  lemos artigos, avisos, placas, sinalizadores, bâneres (sim, como
açúcares), fôlderes (idem), volantes e similares - quando não, são falas de pessoas
públicas  -  com erros das mais variadas ordens que, devido à sua repetição, acabam
causando-nos  dúvida, ou induzindo-nos a erros. Hoje veremos apenas dois deles: 


É proibido? É permitida?

As expressões "é permitido", é proibido", "é necessário", "é bom" e similares não variam, 
quando o substantivo a que se referem vier indeterminado, isto é, sem artigo ou pronome
que o defina.  Exs.: 

          É proibido entrada de menores.            É proibida a entrada de menores.
          Coragem é necessário para isso.           Muita coragem é necessária para isso.  

          Ø  Sem o artigo que o preceda, o substantivo ganha status de verbo, por isso 
              empregamos o masculino: 

                          Não é permitido entrar neste local. 
                          É necessário  ser corajoso para isso. 


Ortografia

Como dissemos em páginas anteriores, o emprego do hífen é caso de muitas orações...
Consulte sempre o Vocabulário Ortográfico (VOLP) da Academia Brasileira de Letras.  

Recebemos visitantes em nossa empresa e  surge a necessidade de registrarmos a intenção de que eles estejam bem conosco.  Desejamos-lhes, então: 

                   Bem-vindo!                     Boas-vindas!


Outro engano tem ocorrido com o "a" ou "à".  Veja este erro: "Para ser atendido, aguarde á chamada." 

O "a" pode ser artigo (A candidata chegou.), pronome pessoal (Eu a  vi na recepção.), pronome demonstrativo (Ela é a que está em pé, perto da entrada.) ou preposição (Ela está apenas a um passo de ser contratada.).  O "à" é uma crase entre uma preposição ("a") e um artigo ("a"): num processo de fusão dos dois, escrevo apenas um e marco-a com o acento grave (`).  Assim, Vamos  à entrevista.  

Diante disso, cabe dizer que não existe "á" na Língua Portuguesa. E "ás" é uma pessoa muito boa em sua especialidade:  Senna foi um ás ao volante. 

O cartaz na chamada aos candidatos, corretamente grafado,  é: 

              Para ser atendido, aguarde a  chamada.   

A crase veremos numa próxima edição.

Boa semana! 









sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Impropriedades (III)

A etimologia ajuda-nos a esclarecer significados e a evitar o uso indevido (impróprio) de expressões e vocábulos. Hoje veremos   deferir x diferir,  muito empregados na linguagem jurídica.   


Deferir x diferir

Ambos os vocábulos  são construídos sobre a mesma base: -ferir-. Essa raiz provém de um verbo do Latim cujas formas primitivas são: fero, fers, tulli, latum, ferre. À semelhança do que aprendemos quando estudamos inglês, as formas primitivas auxiliam-nos na conjugação dos tempos delas derivados.  Esse verbo é empregado com o sentido básico de levar, carregar, portar,...  Entre outros, ele forma vocábulos como: aurífero, ferrífero, auferir, proferir, referir  e deferir, diferir, que  são o assunto de hoje. 

Os prefixos  de(s)- e di(s)- acrescentam à raiz (ferir) significados específicos. Oriundo do grego,  dis- indica dificuldade, disfunção, privação, mau êxito, mau fim. Ex. :
          dispneia, disenteria, dispepsia, disfasia, dislalia,...

Do Latim, os prefixos de- de(s)- di(s)-  indicam, respectivamente: movimento para baixo, separação, negação, como em:
          decapitar, decair, deportar, degelo, dejeto, depor,...

ou, ainda, negação, ação contrária, separação, afastamento, como em: 
          desquite, desventura, descosturar, desmontar, discórdia, discussão, ...

Assim, deferir traz estes significados, de acordo com o Dicionário de Caldas Aulete (1):
 
1. Atender a; dar despacho favorável a [td. deferir um requerimento] [tr. + a : O
   
juiz deferiu ao pedido de habeas corpus]
2. Oferecer (prêmio, privilégio etc.); CONCEDER [tdi. + a 
 empresa deferiu bônus aos melhores funcionários]

Diferir, por sua vez, pode ser entendido como (2):
 
1. Apresentar-se diferente; DISTINGUIR-SE [tr. + de Difere de todos os parentes.] [int. : É
 difícil dois irmãos diferirem tanto.]
2. Não concordar; DISCORDAR; DIVERGIR [tr. + de, entre Diferiam entre si, mas 
conversavam muito.] [int. : Tentam chegar a um acordo, mas ainda diferem bastante.]
3. Adiar, postergar [td. Diferiu a data do casamento.]. 

Como vê, embora parecidos na forma, seus significados diferem.  E, se busca  
aprovação,  é  melhor pedir deferimento.

Um exercício muito bom, para ampliar seu vocabulário, consiste em buscar o 
maior número possível de vocábulos que você poderia derivar dos radicais acima 
com o auxílio de outros prefixos e, com os prefixos de hoje, construir vocábulos, 
recuperando aqueles esquecidos na e pela rotina de seu trabalho diário. 

Bom fim de semana.   

____________
1  Consulte:  http://www.aulete.com.br/deferir 
2   http://www.aulete.com.br/diferir